Hospital Ermelino Matarazzo

Hospital Ermelino Matarazzo

Uma das regiões mais carentes de serviços públicos de saúde em São Paulo – a zona leste – tem um dos movimentos populares mais bem organizados. Foi exatamente esta organização que conduziu o arquiteto Siegbert Zanettini e as equipes técnicas envolvidas na construção do hospital municipal Ermelino Matarazzo a viverem uma experiência inédita: planejar a executar a obra discutindo cada passo com representantes da comunidade, ouvindo sugestões acatando mudanças.

Inaugurado em 1991, o hospital começou a ser construído na gestão Mario Covas, como resultado da luta desenvolvida durante anos pela comissão de saúde de Ermelino Matarazzo, ligada ao movimento de saúde da zona leste. O primeiro contato de Zanettini, diretor geral do projeto, não foi apenas com os técnicos da prefeitura mas com os 17 membros da comissão de saúde. Uma reunião complicada que colocou, de um lado pessoas já cansadas de ouvir promessas de representantes de órgãos públicos e, de outro, o arquiteto que pouco sabia das necessidades daquela comunidade.
“Eles queriam era ver o hospital pronto. No inicio, chegaram até mesmo a sugerir que para agilizar a obra fossem usadas as plantas de outro hospital Tide Setúbal”, afirma Zanettini, que precisou partir do be-á-bá para mostrar como a obra deveria ser realizada. Ele começou explicando aos membros da comissão o que era um projeto de arquitetura, por que um hospital adequado ás exigências da população dependia da elaboração de um projeto detalhado e assim por diante.

Pouco a pouco as pessoas começaram a entender o processo e a mostrar o que desejam. Em função de suas sugestões houve mudanças: o número de leitos efetivos aumentou de 220 para 280, além de cem leitos para observação. A construção da unidade de tratamento intensivo (UTI), que não fazia parte do programa inicial, foi incorporado ao projeto. O movimento de saúde chegou a participar de reuniões semanais com a comissão de saúde, que sempre comparecia munida de uma pauta previamente discutida em assembléias com os moradores. Mas essa experiência só foi bem sucedida, na sua opinião, porque, além do trabalho da arquitetura estar lastreado por uma ação social organizada, foi possível contar com a boa vontade dos técnicos envolvidos.

“Houve convergência das equipes de trabalho”, afirma. “A própria construtora compreendeu o processo de participação popular.”
A comissão de saúde acompanhou a construção a partir de reuniões com Zanettini, com representantes da Secretaria de Saúde e de outros setores da prefeitura. Tornou-se também, uma espécie de equipe fiscalizadora e obteve, para isso, autorização para visitar a obra. “Prefeitura, população e técnicos caminharam de maneira correta”, afirma Zanettini.

Ao ouvir explicações dos técnicos em cada etapa da obra, sempre numa linguagem simples, as pessoas começaram a entender, por exemplo, por que era necessária a execução de sondagem, explicada para elas como uma espécie de radiografia do terreno. Passaram a aprender o projeto técnico correto. Dois meses após a primeira reunião elas puderam ver pela primeira vez o hospital materializado através da maquete.
Ao final, os termos técnicos mais usados durante a obra já não significavam um bicho-de-sete cabeças para a comissão. “Nosso hospital é diferente porque nele os detalhes de funcionamento e de arquitetura foram concebidos a partir de sugestões e reivindicações dos usuários. Subimos nos andares para acompanhar o desenvolvimento da obra, para que não atrasasse, opinamos sobre acabamento e fomos entendendo de piso, contrapiso, pé-direiro”, diz um trecho do texto preparado pela comissão de saúde para a população, logo apos a inauguração do hospital.

“O hospital foi inaugurado com as condicionantes do projeto”, afirma Zanettini. “Acho que é um dos melhores projetos de hospital. Aprendi muito. Percebi que certas coisas são extremamente necessárias para a população e às vezes estão fora de nossa realidade”.